Após minha leitura do texto “O papel da escola”
escrito por Roseli Fontana e Maria Nazaré da Cruz que li para aula de 22 de
Maio com a professora Anna Maria Padilha no curso de pós-graduação do mestrado
em Educação da UNIMEP, decidi fazer esta postagem.
É fato que aprendemos grande parte do que sabemos na
escola, das coisas mais elementares às mais complexas. Esse conhecimento que “nos é passado” tem a
preocupação de comprovar e explicar as teorias que nos circundam. Estes mesmos
conceitos têm uma lógica de organização com a intenção de garantir coerência,
exigindo portanto, uma complexidade de operações para se atingir esta meta.
Desde o século XIX propunha-se uma pedagogia
tradicional que permeia o ensino até hoje. Nesta vertente o que se leva em
consideração é a prática do tudo pronto, tendo a preocupação apenas de passar
isso para a criança para que ela os memorize, num ciclo que práticas de
repetição e treinamento de exercícios até que estes conceitos sejam
“devidamente” interiorizados. Esquece-se então que estes conceitos têm história
e que passaram por transformações, que têm sentidos diferentes que dependem de
muitos aspectos (cultura, contexto social, etc.), as experiências nas relações
de outros indivíduos com estes conceitos, etc. Toda esta história é tida como
“erro”, nada mais. Desta forma, não se utiliza o que se aprende (ou o que pelo
menos se pretende ser ensinado), apenas se reproduz aquilo que se entendeu (ou
deveria ter sido aprendido). A reprodução deste conteúdo não garante que o
conceito faça sentido para a
criança. A quantidade de informações fornecidas às crianças são gradativamente
ampliadas no decorrer dos anos escolares. Sendo assim, conhecimento e
desenvolvimentos são cumulativos. Esta pedagogia, então, pressupõe que os
significados das palavras sejam fixos na língua e estão impostas aos
indivíduos.
Com a pedagogia tradicional em mente, existe o
julgamento sobre os dizeres das crianças muitas vezes serem falta de
entendimento, mas esquece-se que a palavra não é transparente, não é linear, e
principalmente que a palavra não se apropria de um único significado. Esses
diferentes significados estão nestes mesmos dizeres julgados pelos professores.
São estes mesmo dizeres que nos mostram qual a relação que estas crianças tem
com estas palavras, mesmo que muitas vezes não façam sentido para nós
(diferentes pessoas atribuem diferentes sentidos à um mesmo objeto, uma mesma
situação).
Embora o foco na elaboração conceitual seja
diferente, Piaget e Vygotsky concordam que estes conceitos “ensinados” na
escola têm sim história e que são desenvolvidas ainda na criança. Piaget diz
que quando se ensina algo à uma criança, tira-se dela a oportunidade de
descobrir sobre isto. Vygotsky, por outro lado, evidencia a importância da
relação com o outro, e que no conceito de zona de desenvolvimento proximal (por
ele desenvolvido) é que a criança fará no futuro o que hoje depende do outro
para fazer.
Extraindo o foco do ensinar para focar no processo de
aprendizagem, coloca-se no alvo a criança e não o professor. A elaboração ativa
do conhecimento passa a ser importante, e não o simples acumulo de conhecimento.
Nesse sentido, as propostas ativas de ensino têm grande influência das ideias
de Piaget que leva em conta o fato de que os conhecimentos científicos são
frutos de um processo de construção que depende do estágio de desenvolvimento
do indivíduo. Ele considera que os conceitos não se ensinam, mas situações
devem ser propostas para que a criança os formulem. Nestas situações a criança
entenderá o porque de se aprender algo e fará suas relações analíticas ou suas
generalizações através de seu desenvolvimento cognitivo, daí elaborando a
palavra.
O processo de aprendizagem deve ser conduzido de
acordo com a espontaneidade do desenvolvimento da criança, acompanhado pelo professor. Para a construção conceitual da palavra
deve-se possibilitar a expansão da ação e expressão da criança, possibilitando
assim que os conceitos sejam elaborados espontaneamente. Assim, o que na
pedagogia tradicional é sistemático e considerado erro, agora é um indicativo
do desenvolvimento da criança, uma vez que a liberdade de elaboração do
conceito mapeia a construção e os caminhos do pensamento. Quando o “aprender
pensando” é motivado e tem espaço, o ensino deixa de ter função informativa ou
de instrução, e passa a ter o objetivo de contribuir para o desenvolvimento dos
indivíduos.
Os adultos participam espontaneamente do processo de
elaboração e utilização da palavra pela criança compartilhando com elas as
palavras que se fazem necessárias nas situações imediatas nas quais estão
envolvidos. Evidentemente o foco desta colaboração está na situação em si, e
não na intelectualidade desta situação. Na maioria das vezes o foco nestas
situações vivencias não vai estar nos diferentes significados que uma
determinada palavra possa ter para cada um dos indivíduos nesta relação. Podem
acontecer, mesmo que raramente, situações na qual o foco mude de ângulo, como
quando por algum motivo há uma explicitação da diferença de entendimento sobre
uma mesma palavra, objeto, evento, etc. por parte dos envolvidos nesta relação.
Na escola este entrelaçamento entre adultos e
crianças no processo de elaboração da palavra é diferente. Ambos ocupam papel
determinante e estabelecido: professor e aluno. Nesta ocasião, a relação é de
ensino-aprendizagem. O aluno está para “compreender” enquanto o professor está
para “orientar’, “informar”, sistematicamente. Vygotsky aponta que não cabe ao
professor significar uma palavra à criança, pois quando o professor faz isto
ele usa outras palavras igualmente incompreensíveis, podendo dificultar ainda
mais sua compreensão. Ao se praticar isso, estimula-se um processo de
verbalização vazio, a repetição pela repetição. Como sugere o psicólogo, é
necessário possibilitar interações verbais nas quais a criança adquira novos
conceitos, elabore e atribua significados às palavras.
Todos utilizamos as palavras nas relações cotidianas.
No entanto, não estamos acostumados a refletir sobre elas. Para a criança,
refletir sobre o modo de se usar as palavras é uma atividade intelectual que
além de nova é bastante complexa. Ao serem estimuladas e exercitar esta
atividade, as crianças buscam na sua memória histórica elementos já
internalizados que de alguma forma se associam àquela palavra. São suas
experiências e o dado contexto imediato que sugerem essas associações, como
sugere Piaget. Neste estimulo, as crianças aprimoram seus conceitos iniciais,
uma vez que são trazidas a refletir e não apenas reproduzir a palavra.
Concluindo, o professor precisa tomar vantagem da sua
posição adulto, que passou por várias experiências que lhe possibilitaram
acesso a um conjunto muito mais amplo de informações, e provocar situações nas
quais as crianças possam apropriar-se das palavras, cada uma na sua
partilaridade. Numa relação de ensino compartilhada, ambos os envolvidos se
desenvolvem e evoluem (talvez a única forma de evolução ainda possível).
Enquanto professor que pensa em desenvolvimento, é preciso ouvir o seu aluno. É
nos dizeres corriqueiros que este conhecimento se torna perceptível, possível.
Indagar o que a criança já conhece e apontar as diferenças que revestem os
conceitos garantirá que novos conceitos se formem, para os dois. O professor,
adulto e mais culturalmente desenvolvido (ainda e sempre em processo de
desenvolvimento cultural), não pode esquecer que a sistematização é complexa, e
que somente é possível através da mediação do professor, o que não significa
ditar ou dicionarizar significados, conceitos, situações, mas sim participar no
processo de construção de tudo isso.